A presumida inocência do artista

A arte é inocente. O que não é inocente são os Artistas, que às vezes confundem o artista com a própria arte, e nós nos confundimos com a arte, nada menos.

Caros Insane Minds:

Há alguns dias almocei com Abel Azcona, o artista, só para constar, a pedido dele e eu para fazer colagem feminista porque às vezes sai pano. Que talvez pareça arrogante eu ir ensinar alguém, mas olha, também pode soar generoso, dependendo de como você encara as coisas.

Total, está tudo bem. Mais ou menos. Mas o que vou dizer é que estávamos falando sobre a responsabilidade do / do / do artista. Falo assim, meio brincando porque tem algo muito intenso, que afetou a intensidade artística, que diz que a arte é inocente ou coisa parecida.

Para que fique registrado, querido Minds, eu concordo. A arte é inocente, porque a única coisa que falta é que não era. O que não é inocente são os Artistas, que às vezes confundem o artista com a própria arte, e nós nos confundimos com a arte, nada menos.

Porque, eu também te digo: se o mundo da arte, o mundo literário e todas essas coisas têm uma coisa, estão chutando egos que você não vai acabar em duas vidas.

Vamos em partes:

  • Por um lado, estamos falando de arte porque parece algo assim mais importante fazer Insane Minds do que falar sobre yoquesé, fazer sapatos. Mas não, a dinâmica da inocência e da culpa é a mesma.
  • Por outro lado, à medida que avançamos, não podemos passar pela vida como se não tivéssemos responsabilidade por nossas ações. Podemos, é claro, mas é assim que funciona, e é assim que o mundo funciona.

A base do intenso debate sobre a responsabilidade da arte, no final das contas, é um debate sobre a responsabilidade do ser humano com seu meio ambiente e com respeito às suas obras e ações, seja calçado, seja dirigir motocicleta, seja escrever um texto ou se relacionar com o vizinho.

O que acontece é que todos assumem que você é o responsável pelo modo como dirige uma motocicleta e já se sabe que não se deve atropelar as pessoas, assustando-as e angustiando o restante dos motoristas, por mais que isso seja feito constantemente.

Bem, com arte e coisas assim elevadas (digo de forma irônica) parece que tudo tem que ir em outras direções porque as pessoas que fazem arte e parece que somos de outro planeta e para nós operam outras regras.

Pois não. Fazer discurso público deve ser um ato de responsabilidade também, não só, mas também.

Ou seja, um ato de responsabilidade como qualquer outro ato. E fazer arte, sim, é fazer discurso. Acreditar que existe alguma forma de arte que não seja política é não entender o que significa política, e acreditar que só o que é sobre partidos e siglas ou o que é sobre intenção é político.

O político é tudo que tem impacto na vida pública, na vida comum, seja intencional ou não, aconteça ou não no espaço público. A arte, sem dúvida, é sempre política.

Às vezes conscientemente, outras vezes, sem perceber o que está fazendo, porque a arte é inocente e aí você se protege e como tudo é maravilhoso.

Como se isso não bastasse, deveria haver o agravamento da atemporalidade, já que alguns discursos permanecem, nós os deixamos no ar e eles continuam lá, espalhando-se mesmo quando já mudamos de opinião ou já entendemos que não pode.

Quando você levanta isso em um ambiente de artista você pode ouvir as roupas rasgando, porque, vamos ver, nós também temos o direito de estar errados! Sim, temos, mas ainda temos a obrigação de consertar os bugs, que é algo que, novamente, todos deveriam fazer.

Tudo isso não se resume em arte séria. Na verdade, quanto mais inconsciente de sua incidência política, mais a arte tende à seriedade, que é meio imponente, ao cerimonial, à pompa.

Bem, nada, aí eu deixo.

Feliz semana, Minds!

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