O corpo é o seu templo (como colocá-lo em prática)

Manuel Núñez e Claudina Navarro

Árvores e cavernas devem ter sido os primeiros templos externos do ser humano. Mas antes deles já existia o nosso corpo, aquele espaço que acolhe as experiências mais sublimes e que como tal merece ser tratado.

O corpo possibilita todas as grandes e pequenas experiências da vida, desde comer até trabalhar, brincar ou amar. Mas também está sujeito a doenças, dor, envelhecimento e, em última instância, morte.

A rejeição do corpo é bem conhecida na tradição religiosa cristã ocidental, mas também ocorreu no Oriente. O bramanismo hindu compartilha da visão do ascetismo cristão quando descarta o corpo como irreal ou como uma carga densa a ser libertada. Alguns textos budistas a definem como uma fonte de sofrimento, e qualificadores semelhantes podem ser encontrados no Judaísmo e no Islã.

O corpo pode ser um aliado do crescimento interior

Porém, nas mesmas tradições encontramos palavras que enaltecem o corpo como uma materialização própria do divino. Junto com a tendência de separar o corpo do mais sublime do ser humano, há a intuição de que na prática eles estão unidos ou são a mesma coisa.

Para Jorge N. Ferrer, autor de Creative Spirituality (Ed. Kairós), seria desejável deixar para trás a ambivalência das tradições espirituais para abraçar definitivamente o corpo e o universo material como manifestações espirituais.

Cuide disso, além da saúde

Considerar o corpo como um templo leva a cuidar dele com uma intenção que vai além da manutenção da saúde. Ou, no caso de doença, tentar se curar por meios naturais, não tanto lutando contra os sintomas, mas respeitando a inteligência do corpo, que pode usar a doença para favorecer uma virada existencial ou uma mudança de valores. O corpo pode ser um professor mesmo quando está doente.

Mais do que evitar transtornos, trata-se de promover o desenvolvimento de seus extraordinários potenciais de vitalidade. Para isso é necessário conhecer sua estrutura. A sabedoria tradicional o descreve como uma combinação de três níveis distintos: físico, mental e espiritual.

Além das descrições teóricas, tudo no corpo está conectado. É por isso que técnicas como ioga, tantra ou artes marciais atuam no corpo físico para atingir objetivos espirituais ou imateriais.

Ao comer, respirar e praticar certos exercícios, seu funcionamento pode ser refinado até que se torne um instrumento de conhecimento.

Práticas de consciência corporal

Tratar o corpo como um templo significa cuidar de todas as suas dimensões, da mais física à mais elevada, lembrando que nenhuma prática se concentra exclusivamente em uma delas. Lavar, vestir, beber, comer, saudar, dar, receber, colecionar … qualquer um desses atos é um convite a estar mais atento.

Os exercícios físicos, como diferentes esportes ou caminhadas, podem ser tão ritualísticos quanto as técnicas que trabalham as energias sutis (tai chi, ioga, chikung, certas massagens), e até mesmo os diferentes tipos de meditação e visualização, que operam no nível de consciência.

Ao longo do dia e da semana há tempo para se dedicar de forma equilibrada e de acordo com as características pessoais a cada tipo de prática.

Outra forma de exercitar o corpo

A combinação permite enriquecer a qualidade de cada um. Por exemplo, ao correr ou andar de bicicleta não nos concentramos mais em queimar calorias ou aumentar o desempenho, mas prestamos atenção na harmonia dos movimentos, na respiração, nas sensações que experimentamos e na relação com outros seres vivos.

O treinamento de força e resistência, que muitas vezes leva a uma sensação de exaustão, nos familiariza com a capacidade de renascer e ultrapassar os limites.

Essas experiências são certamente tão importantes para o ser humano que explicam em grande parte a prática do esporte de alta competição ou do montanhismo.

Alcançar a flexibilidade e o controle do corpo exibidos por iogues experientes requer um esforço equivalente, acompanhado por conquistas internas para as quais nenhum diploma é concedido.

Os praticantes de disciplinas psicofísicas desenvolvem habilidades que lhes permitem administrar adequadamente os estados mentais, emocionais e energéticos. Assim, eles cultivam a serenidade e promovem o crescimento psicológico ou espiritual.

Na ioga ou no chi kung, esse domínio se refere à energia vital que desce e sobe pelo tronco do corpo como em um circuito fechado.

O objetivo final dessas práticas é alcançar tal fusão entre as estruturas físicas e energéticas do corpo que o desdobramento dos extraordinários potenciais de compreensão e longevidade referidos nas antigas tradições seja possível.

Reconecte-se com o corpo e com a Terra

As tradições espirituais veem uma ressonância entre o corpo e o cosmos. Em sua operação, toda a sabedoria e capacidade criativa da natureza são expressas.

A mente pode ansiar pelo conhecimento das leis físicas e químicas, mas o corpo humano já é o resultado mais completo de sua aplicação. De alguma forma, o objetivo deve ser conectar-se com o que o corpo já conhece.

A experiência do corpo como entidade sagrada - digna de respeito - é um primeiro passo para considerar toda a natureza como sua origem e seu lar. Conseguimos assim uma dupla contenção, no nosso corpo e na Terra, que cura a estranha sensação de não fazer parte deste mundo.

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