"Quanto mais tentamos controlar o medo, mais o alimentamos"

Eva Millet

Terapeutas de todo o mundo se inspiram no trabalho do psicólogo e terapeuta Giorgio Nardone, um dos maiores expoentes da terapia breve estratégica.

Giorgio Nardone é um dos maiores expoentes da terapia breve estratégica. Baseada na lógica, essa terapia consiste em uma intervenção terapêutica breve - menos de 20 sessões - para eliminar comportamentos disfuncionais, bem como para produzir uma mudança nas modalidades com as quais a pessoa constrói sua própria realidade. Nardone o define como "um método para resolver problemas humanos muito complicados com soluções aparentemente muito simples".

É aplicado há mais de 25 anos no centro Giorgio Nardone em Arezzo (Itália). Os controles da eficácia do tratamento, realizados por equipes externas, revelam que 88% dos pacientes estão curados de várias patologias que podem ser incapacitantes.

-Sua prática estabelece métodos para o tratamento de patologias como transtornos alimentares e transtornos obsessivo-fóbicos. Nossa sociedade está cada vez mais fóbica?
-Sim. Os ataques de pânico são muito mais avançados. Você criou a ilusão de ser capaz de controlar tudo e, em particular, sua saúde. Infelizmente, essa ilusão entrou em colapso, porque a medicina falhou em combater certas doenças. Isso provoca uma crise de confiança no controle de certas coisas e, quando isso se perde, surge o medo …

-Qual é a origem dos ataques de pânico… -Isso
mesmo. As pessoas também têm outra ilusão: por meio da razão, podemos controlar todas as reações. Porém, quanto mais tentamos controlar racionalmente o medo - o que é irracional - mais ele se alimenta. O medo não passa pela razão, mas segue mecanismos periféricos muito mais rápidos ou pelo paleoencéfalo, a parte mais primitiva do cérebro. Portanto, se tentarmos inibir o medo com a razão, o alimentamos, é um efeito paradoxal.

-Mas uma dose de medo é útil para sobreviver. Como sabemos quando o medo é saudável?
-Em um ataque de pânico, um medo saudável é ativado primeiro: uma reação a um estímulo que começa no paleoencéfalo e que é muito rápido. Então, vem a reação da mente moderna, que busca inibir esse sentimento; e, nesse choque, emoções são criadas. Quando esse medo não nos deixa avançar, devemos agir. Uma técnica é a teoria da "pior fantasia": o paciente deve aumentar seu medo mentalmente, voluntariamente, a fim de amortecê-lo. É um paradoxo, mas funciona.

-É realmente possível curar a mente de forma rápida e eficaz?
-Estou demonstrando isso por 25 anos. Existe um preconceito de que se o sofrimento durar muito demorará muito para sarar. Mas não é o caso, pelo contrário: quanto mais incapacitante for a patologia, mais rapidamente ela pode ser quebrada, usando a mesma força da desordem como alavanca.

-O que você acha das terapias de longo prazo, como a psicanálise?
-Eu os respeito, mas devem ser aplicados a problemas que envolvam crescimento pessoal, não uma solução. A terapia breve é ​​aplicada a transtornos incapacitantes, enquanto a terapia de longo prazo é geralmente aplicada a transtornos de personalidade não incapacitantes.

- Qual a importância da terapia breve estratégica para o passado?
-Nos distúrbios pós-traumáticos, o passado é muito importante porque determina o presente e o futuro. Mas na maioria das condições incapacitantes, como ataques de pânico, é o medo do futuro que cria os problemas no presente. É por isso que o futuro está sendo trabalhado, para que influencie o presente. O passado serve como fonte de informação, mas não é o lugar para trabalhar porque o problema evoluiu.

-Por que existem pessoas que podem superar uma experiência traumática sem ajuda?
-É uma experiência de vida. Uma criança que vive uma situação traumática enfrenta esse problema a partir de sua própria experiência de vida e se torna mais resistente. Mas outra criança, da mesma família, torna-se esquizofrênica. A explicação é casual, não causal. Na década de 1950, o antropólogo Gregory Bateson conduziu um experimento com golfinhos. Os treinadores começaram a recompensar aleatoriamente seus animais, em vez de por fazerem bem as acrobacias. Um dos golfinhos acabou batendo na beira da piscina, pois não conseguiu estabelecer comunicação. O outro golfinho, por outro lado, melhorou suas piruetas. Diante da loucura, ele se tornou mais habilidoso, melhor. Repito, não é uma explicação causal, é acidental.

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